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Ranil, Analog Africa

17/05/2020

Descubro que Ranil é mais uma das vítimas da pandemia quase ao mesmo tempo em que escuto a excelente compilação de sua música que o selo Analog Africa acaba de lançar. Ele foi um dos principais inventores da cumbia amazônica, também conhecida por chicha ou cumbia psicodélica (um ramo da rede de estilos de apropriações da guitarra elétrica, e da surf music, que a grande floresta, e sua comunicação ribeirinha, também fertilizou – incluindo obviamente a guitarrada paraense). Estava na ativa, produzindo maravilhas dançantes e viajantes, desde os anos 1960. Era conhecido mais na região de Iquitos (que recentemente virou um dos epicentros de outro tipo de “psicodelia”: o “turismo” da ayahuasca), sua cidade natal (da qual tentou ser prefeito – informações difíceis de sem encontradas em pesquisa online, mostrando que há ainda zonas bem fora do radar da onipresente internet). Pena que não vai aproveitar a maior acessibilidade de sua obra, via Analog Africa. Mas é nosso dever espalhar suas criações por todos os lugares (lutando também pela sobrevivência da floresta, e de povos da floresta, que há milênios inventam estratégias sofisticadas para misturar bem natureza e cultura). Poucas músicas podem ser mais alegres.

Aṕroveito para celebrar também a obra da Analog Africa. Sua breve existência, de 2006 para cá, mostra perfeitamente como paixões pessoais podem virar projetos eficientes em rescrever a imaginação geral, injetando coisas boas na caretice do mundo. Samy Ben Redjeb, o fundador, viajou muito para África como instrutor de mergulho e comissário de bordo da Lufthansa (ele é tunisiano, criado na Alemanha). Colecionava discos que dificilmente circulavam fora de seus países. Queria que aquelas pérolas fossem melhor conhecidas. Conseguiu. Montou uma gravadora que já fez muito mais gente entender que a Orchestre Poly-Rythmo de Cotonou, do Benin (que tive a honra de ajudar a trazer para tocar no Brasil num Percpan), ou a Dur-Dur, da Somália, estão entre as bandas mais incríveis de todos os tempos no planeta.

Apesar do nome, a Analog Africa também lança discos de outros continentes. Inclusive discos de grandes artistas brasileiros que são quase impossíveis de serem encontrados por aqui. Como as compilações do Mestre Cupijó. Ou de outros músicos paraenses: a Jambu (bateu agora uma saudade da pizza de jambu do Café Imaginário que havia em Belém…) tem, por exemplo, a faixa Xangô, assinada por Magalhães e Sua Guitarra (tem também Pai Xangô, de Pinduca, e um Carimbó para Yemanjá, de Orlando Pereira, revelando a forte presença da África na Amazônia). Recomendo especialmente o disco do Mestre Camarão, sanfoneiro pernambucano da pesada, música para levantar qualquer astral.