missão

Minha intenção era publicar o post de ontem apenas para recomendar um podcast. A evolução da escrita me surpreendeu: o texto virou um manifesto para salvar o mundo. Já era tarde, eu estava cansado, com pressa para ir dormir, o terceiro parágrafo ficou totalmente incompreensível. Volto aqui para tentar esclarecer. Melhor aproveitar a argumentação de David Baltimore, que não é apenas excelente cientista de laboratório, mas homem de ação em muitos outros campos (e ele declara: “eu amo instituições”, por isso foi reitor de universidades etc.). Aproveito para fazer uma tradução e um resumo MUITO livres de trechos da sua entrevista para o Mindscape Podcast (o original está aqui em áudio e transcrição):

Precisamos ter em nosso armamentário, remédios que inibirão o desenvolvimento dos coronavírus. Todos os coronavírus estão relacionados uns com os outros. Todos fazem basicamente o mesmo conjunto de coisas. Eu diria que a indústria farmacêutica, com tempo e dinheiro suficientes, poderia produzir um remédio contra os coronavírus, e não seria necessário saber qual coronavírus específico para ter moléculas inibidoras. […] Deveríamos nos dedicar a isso agora, mesmo que seja tarde para a COVID-19. Para a COVID-20 e 21 e 22 não é tão tarde, e deveríamos nos dedicar a isso para que nunca mais sejamos atingidos como agora. […] Não vejo essa dedicação acontecendo. […] Enquanto dependermos do lucro, não vamos nos dedicar a isso […] Temos que encontrar uma maneira de financiar e incentivar a pesquisa pública e das universidades […] E não só para coronavírus. A mesma coisa é verdadeira para toda uma variedade de outros vírus. […] O novo coronavírus não é algo fora da curva, e deveríamos estar nos preparando uma pandemia como a atual. Houve os alertas com a SARS e a MERS que revelaram que os coronavírus tinham a habilidade de aparecer em novas formas que não conhecíamos, que estavam por aí no mundo. Deveríamos trabalhar para identificar cada vírus num morcego pois os morcegos parecem ser um reservatório eficaz para vírus que podem atacar seres humanos. Mas não são só os morcegos. Todo o mundo natural tem vírus com os quais precisamos nos preocupar. […] Devemos levar tudo isso muito a sério. Agora, faremos isso? Eu não sei. […] E eu não sei porque já sabemos disso há muito tempo. Isso é saúde pública. E a história da saúde pública nos mostra que quando uma coisa deixa de ser um problema imediato, então perdemos nosso foco e passamos a usar os recursos para outros fins e essa precisa ser a lição das lições

Que fazer? Hoje acordei com as notícias de um novo vírus parente do H1N1 entre porcos de fazendas chinesas. Vamos viver assim? Esse é o novo normal? Como encarar a lição das lições, inventar um novo movimento político para que essa pesquisa seja realizada com os recursos que precisa, com a transparência necessária? Esse novo movimento político tem que ter a força de uma pandemia. Não pode deixar por menos. E não dá para esperar que Bill Gates ou a OMS nos salvem. É missão para todo mundo, que não deve ser pensada apenas como uma batalha científica contra um vírus – para dar certo, certamente vai exigir mudanças profundas em todas as áreas de nossa vida atual. Mas não tem jeito: teremos que enfrentar o desafio.

2 Respostas to “missão”

  1. física e virologia – e o mundo | Hermano Vianna Says:

    […] saudade missão […]

  2. complementos Ilustríssima 4 | Hermano Vianna Says:

    […] Institute). E uma tradução de trecho maior da resposta de David Baltimore para Sean Carroll neste outro post […]

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